domingo, 28 de agosto de 2011

Vivendo e aprendendo a jogar...


Vivendo e aprendendo a jogar
Vivendo e aprendendo a jogar
Nem sempre ganhando
Nem sempre perdendo
Mas aprendendo a jogar
Nem sempre ganhando
Nem sempre perdendo
Mas aprendendo a jogar 
(Guilherme Arantes)

Não vai ser desta vez que serei um dos, de fato raros, que já completaram o UTMB. Fui cortado, com menos de 12 horas de prova, por ter ultrapassado o tempo máximo em Les Chapieux. Fiz o possível, mas para essa prova o meu possível não foi o suficiente. Lógico, fiquei chateado. Mas vim para conhecer meus limites, e foi exatamente o que descobri.
Comecei a prova tranquilo, no ritmo que eu e o Alberto , o único outro brasileiro a fazer o UTMB, havíamos planejado. Logo veio uma subida, e passamos alguns corredores. Em seguida uma descida bastante enlameada. Muitos começaram a me passar, eu disse para o Alberto ir embora, mas continuamos juntos até o primeiro ponto de apoio. Quando chegamos lá com 20 minutos de atraso – de um planejamento que já era bastante apertado – vi que a situação estava difícil. Era tentar tirar o atraso.
No trecho seguinte – principalmente de subidas - me esforcei muito para passar no primeiro corte. Cheguei apenas a oito minutos do tempo limite. Saí em dois minutos. Consegui. Ainda dava para continuar...
Em seguida um longo plano, e depois uma subida forte, em trilha. Administrei bem. Cheguei no corte seguinte com o mesmo tempo de sobra. Devorei uns quatro pratos de sopa, nem troquei de roupa, e fui em frente.
Era uma longa e pesada subida, em que começou a cair uma neve fina. Estava me sentindo estranho. Sabia que não era desidratação – um de meus fantasmas – pois minha urina estava de cor normal. Então, percebi... Havia esfriado muito, e eu continuava, mesmo sendo dia, só com a lanterna na cabeça e luvas de trilha nas mãos. Parei, coloquei gorro, luvas e o cobertor térmico no pescoço. Tudo melhorou.
Passei, sem parar, em um posto de água, e cheguei num outro ponto de controle no topo da montanha, no Refuge Croix du Bonhomme . Eram 9h52min. Eu tinha pouco mais de 50 minutos para chegar no próximo corte: cinco quilômetros de descida, enlameada descida.
Foi fatal. Mesmo sendo o trecho em que mais me esforcei - cheguei a cair três vezes - estava lento, e fui ultrapassado por muitos. Cheguei no posto às 11h22min, bem depois da barreira horária. A corrida havia acabado para mim. Não tenho de quem o do que reclamar. Achava que havia me preparado bem para a prova, mas não era verdade.

Gosto de provas assim, por mais incompetente que seja nelas. E o UTMB me fez perceber o que já deveria ter descoberto, mas demoramos muito para aprender...No plano e nas subidas sou tão bom quanto os outros corredores que, com planejamento e paciência, terminam o Ultra Tour no tempo limite. A diferença acontece nas descidas – em especial nas que estão molhadas. Nelas sou muito pior... E essa difernça não me permitiu ir em frente. Mas não tem desespero, não...Vou querer voltar, mas para isso preciso treinar – e muito – descidas em trilhas. Isso não se aprende em três meses, acho que nem em um ano. Mas, tenho certeza, se aprende. É questão de paciência e determinação. Quando sentir que estou pronto, me inscrevo de novo para testar a minha teoria. Que, espero, vai estar certa dessa vez...

Adendo 1: O Alberto foi bem mais longe do que eu. Infelizmente – pois sei que teria condições de terminar inteiro – acabou por ser cortado em um posto que nem era, oficialmente, uma barreira horária. Fez 118 km, e correu por cerca de 28 horas.

Adendo 2: Vi a chegada da UTMB. Acho que há uma síndrome que poderia se chamar “complexo de Torre de Pisa”, e que não sei se já foi estudado pela medicina. Vejam o meu vídeo chegando na BR135 (http://www.youtube.com/watch?v=AhdPrJXgMy4). Vários corredores chegaram assim. Felizes e passageiramente tortos. Pois é, como a torre, vários de nós pendem, mas não caem.

Um abraço para todos, em especial para o meu amigo Toshi, sem quem eu não teria completado a "Country to Capital" no início do ano, e que terminou a sua primeira CCC.

A aventura continua...

domingo, 14 de agosto de 2011

Dez anos correndo, ou de como o Paulo virou Pul


Há dez anos, numa manhã de outubro, estava no meio de uma pequena multidão. Não, eu não tinha ideia do que ia acontecer. Depois de terminar 30 anos de convivência com o tabaco – uns vinte deles fumando dois maços de cigarros por dia – esperava o começo do que deveria ser a minha tentativa de virar corredor. Já fazia natação, em que sou péssimo ainda hoje, e musculação, que é chato mas necessário. Como poderia saber que ia encontrar um Paulo que nem sabia que existia?
Naquela manhã minha vida começaria a mudar de forma irremediável. Fiz, com paciência e coragem, a Volta da Pampulha, depois de uns dois meses de treino em que comecei mais andando que correndo. Durante a prova eu - que os amigos sabem, “adoro” alongamento – corria 15 minutos e parava para me alongar. Terminei os 18 km em 2h e 20 minutos. Não sei em que momento senti aquela euforia que ainda me acompanha em varias provas, ou quando comecei a me controlar para não chorar. Só sei que quando terminei a prova um outro Paulo tinha nascido. Um que foi batizado, muito depois, de Pul, num dia em que a Dira me chamou de “Paulo, o ultra ligeirinho”. Foi depois das minhas primeiras 24 horas, em que eu estava em êxtase: não podia acreditar que tinha feito mais de 150 km...
Não, eu não sou ligeirinho. Quando eu nasci, naquela Volta da Pampulha, um anjo danado, o chato de um querubim, disse que eu estava predestinado a ser lento assim. Desde o começo a minha falta de velocidade foi marcante. Mas devagar e pacientemente eu fui juntando conquistas: estreia em duas maratonas – a de Verona e de Viena – em dois fins de semana seguidos, cinco maratonas em dois meses em 2004, a CCC em 2009, mais de 1000 km corridos em provas no ano passado – que começou com a BR135. Claro, muitas provas eu não consegui terminar, principalmente por causa do tempo limite. Mas isso faz parte da vida, é preciso testar os limites...
Neste ano completei algumas, entre elas a Comrades, que corri com a Hedy. Prova maravilhosa e – perdoem-me os que pensam diferente– fácil e divertida. Pouco mais de 80 km em 12 horas, com aquela multidão o tempo todo dando apoio, é muito bom.
Agora acabou a brincadeira. Em quinze dias vou enfrentar a prova mais difícil da minha jovem carreira. O Ultra lentinho vai pela segunda vez enfrentar os Alpes franceses. Da primeira, há dois anos, foi a CCC. Agora é o monstro inteiro: o Ultra Tour de Mont Blanc, com os seus 166 km, mais de 9 mil metros de desnível e – o que mais temo – 46 horas de tempo limite.
Não sei se será possível terminar, mas tenho treinado a sério, e vou fazer o melhor que posso. Às 18 horas do dia 26 – 13 no horário do Brasil – vai começar o desafio. Há melhor forma de comemorar meus dez anos de vida? Venha o que vier, com certeza vou lembrar de todos você quando estiver correndo – ou melhor, me arrastando – pela França, Itália e Suíça. Se tudo der certo, vai ser maravilhoso. Se não der... Bem, torçam por mim. E obrigado por terem tornado a minha vida em algo tão divertido. Esta prova – complete eu ou não – eu dedico a todos vocês. Saúde, irmãos.